sábado, 1 de janeiro de 2011

Fora dos trilhos



Juvenal tirou a noite para afogar as saudades num barzinho de Copacabana. Estava no Rio implantando a filial de uma empresa de grande porte.
Longe da dona Candinha e da família há mais de quarenta dias, não aguentava o tédio da solidão. A esposa não pôde acompanhá-lo devido às suas rotinas em Belo Horizonte cuidando da casa e dos filhos. Ali estava o personagem no balcão acompanhado, apenas, do copo de Whisky e das pedras de gelo que eram mexidas com o dedo indicador num ritual monótono.  Tinha um bom salário que lhe permitia roupas de grife para disfarçar uma aparência em desacordo com os dotes de beleza vigentes. Na verdade ele era feio mesmo. No que a natureza o privara,  o beneficiara em inteligência e simpatia. Ótima companhia para longos papos.   Não era homem de beber sozinho.  Garçom atencioso, tira-gostos e músicas de primeira qualidade num ambiente de pouca luz começaram a atiçar seus instintos masculinos.  Nesse clima entrou Helena e seus atributos femininos bem cuidados, deixando perceber que estava procurando ou esperando alguém. 
Como não quer nada, querendo, aproximou-se e pediu um suco de laranja e logo estava de papo com o Juvenal. Demorou pouco e já rumavam pro apartamento da moça para continuar a conversa.
Juvenal já tinha virado Ju e Helena, Lena.
No aconchego do apartamento e no rala e rola que se seguiu, eis que entra um marmanjão atravessando a sala deixando no ar um boa noite gutural para os pombinhos enamorados.
Lena nem se abalou, parecia uma circunstância comum.
Juvenal quase teve um infarto.
Quando lhe voltou a fala quis saber quem era o sujeito.
- Esquenta não, é o meu marido Joca.  Ele não liga pressas coisas.
- Ele não liga, mas eu ligo, ora!
Um turbilhão de culpas e medos começou a atormentar a mente do pobre homem.
Rapidinho deixou o lugar, rumando para o hotel aliviado por não ter levado, na melhor das hipóteses, uma violenta surra naquela situação.  Ainda mais que os crimes passionais ainda eram atenuantes nos anos sessenta.
No dia seguinte, entrando em seu escritório na zona sul para trabalhar, assusta-se com a presença do maridão sentado, confortavelmente, numa poltrona de couro da antessala.
- O senhor Joaquim está esperando com notícias da dona Candinha e de Belo Horizonte, disse a eficiente secretária ao executivo amarelado e boquiaberto.
Naquela hora soube que Joca era Joaquim e que caíra num golpe dos infernos.
Fazer o que?!
Só restava tocar a situação e ver onde iria parar.
Já na sala, acomodado à sua frente, começou a cantilena.
-Pois é doutor Juvenal, o meu casamento não anda nada bem.  Grana curta sabe como é, não?!  Pensando bem, continuou, sabe não!
O senhor tem uma casa confortável na zona sul da capital de Minas, carro importado, é sócio do melhor clube de lá, filhos estudando no colégio mais caro e, casado, ainda, com a dona Candinha, um exemplo de mulher. Dedicada à família e tudo mais.  Pena que ela é meio brava, né doutor?!  Eu escutei, ontem, a sua conversa desesperada com a Lena depois que entrei em casa.  Está tudo gravado. Faço isso para me documentar e provar, se preciso, as aprontações daquela megera.  Estou aqui hoje para ver se o senhor pode me ajudar. Tô na maior pitimba. Não tenho dinheiro para nada.
Ali começou o calvário do Juvenal.
O moço virou freguês.  De tantas idas e vindas tinha se tornado, até, amigo da sua secretária.
Um dia, vendo que a extorsão não teria fim, a vítima explodiu.
- Quer saber de uma coisa, seu safado, pode mandar a tal fita pra Candinha pois a partir de hoje não sai mais nenhum tostão do meu bolso.
- Deixa pra lá doutor Ju, já consegui um bom dinheiro.  Outra coisa, procure um médico.  O senhor anda muito nervoso.  Cuidado com o coração, hein?!

Fred, dezembro de 2010.

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