terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Um susto pai d'égua.



Fred, 29 de fevereiro de 2012







Bons dias, com muita saúde, a todos que por aqui passarem. 

Pela primeira vez, vou tentar usar meu blog para relatar acontecimentos cotidianos em virtude do inusitado de uma situação vivida por mim e que possa ter algum interesse e utilidade.

A história mereceria um conteúdo mais detalhado mas, quando comecei a redigir sobre o assunto, ainda estava engrossando o sangue ou, convalescendo. Pensar e escrever naquele momento era quase impossível. Acabara de chegar de Belo Horizonte, depois da alta no Hospital Felício Rocho (com ch mesmo).

Aconteceu assim:

- Dia 15/02 acordei aqui em Lavras às 5:55 com um líquido escorrendo do fundo da garganta para baixo. Pensei logo: só pode ser sangue;
- levantei e fui prum dos banheiro de cima e conferi a abundância da coisa;
- deixei descer pelo nariz e tentei estancar erguendo a cabeça;
- nada de parar - fui para a outra pia já que a primeira entupiu com coágulos;
- aconteceu a mesma coisa;
- fui pra pia do lavatório de baixo e...repetiu o troço...
-aí, com uma toalha ensanguentada no rosto, acordei a Fátima e pedi que ela ligasse urgentemente para o Hospital Vaz Monteiro avisando o tipo de emergência que iria chegar...
- pedi, também, que acionasse o Horácio que, acho, chegou aqui antes dela desligar o telefone;
Lá no Hospital enfiaram umas coisas na minha narina direita que, resumindo, foi a pior dor que já passei nesta vida.
O trem é sem anestesia, gente.
Empurram uma espécie de balão murcho que depois enchem com ar para que ele vire uma bola maior quando está lá dentro e obstrua, internamente, o sangramento arterial.
Bão, isso foi feito pelo médico plantonista orientado pelo otorrinolaringologista que só pode comparecer no hospital umas duas horas depois. Nesse interim a tal gambiarra não aguentou a pressão e voltou a minar sangue arterial pela venta direita. Reboliço no hospital. O Horácio perdeu as estribeiras como nunca eu tinha visto antes. Torrou os médicos, enfermeiros, hospital e quem aparecesse na reta. Nisso o otorrino já estava lá e, infelizmente, ouviu poucas e boas. Ainda encontrei forças para entender a coisa e argumentar com meu filho, desculpando-me com o médico. Numa agitação dos infernos foi-me explicado que Lavras não dispunha do equipamento para a cirurgia.
Enfiaram-me numa daquelas ambulâncias da Unimed após a burocracia necessária e rumamos para BH. (esqueci: na mesma manhã chegaram minha filha Juliana e seu marido Breno que ajudaram, muito, nas providências e apoio)
- não mencionei a triste figura que me tornei  depois do procedimento para tentar estancar o sangramento.
Para evitar que os troços que estavam dentro da minha narina descessem pro pulmão ou o que o valha, prenderam a gambiarra numa tesoura e, esta, com esparadrapo branco no meu rosto.
O Horácio que não costuma perder piadas, ou inventá-las, em qualquer situação que esteja, fotografou e enviou pros celulares da Rô e da Ju.
- voltando à ambulância fomos enfiados, eu e a minha gambiarra nasal, na dita cuja para encarar cerca de 250 km que separam o Hospital Vaz Monteiro de Lavras do Hospital Felício Rocho de BH.
Fui acomodado na maca da viatura que é encaixada num trilho no solo e, o corpo do paciente, sobre um colchão sem vergonha, preso com duas cintas e pronto, assim, pra ser remetido, via entrega rápida.
Como o tal esparadrapo não mais colava no rosto a gambiarra de emergência, tive que improvisar nas 480 curvas estimadas do trajeto. Eu não sabia se me agarrava nos apoios laterais da maca ou segurava a tesoura dependurada. Assim, se a curva começava a ser feita pra esquerda, eu soltava a mão direita, para firmar a tesoura evitando a alavanca dolorida que o seu balançar fazia nas profundezas da minha fuça.
Imaginem quando o movimento era pra direita e pra esquerda numa seqüência rápida. Era um tal de pqp, fdp, vtnc, ai car..., etc. Nessas horas, sou muito criativo pressas coisas. Dessa forma, imaginem os piii da censura que a todo instante seriam ouvidos no interior da condução.
Ainda encontrei tempo para lucubrações filosóficas ao pensar: burguesinho afrescalhado, p.... nenhuma. Queria ver algum desses bostinhas - vermelhinhos de ocasião - que nunca sentiram na pele as agruras do zé povinho (preconceito na conta desses...), numa situação próxima a esta.
Alguns de vocês, provavelmente já viram isso de perto nos transportes de emergência.
Estou relatando uma remoção feita num veículo padrão da Unimed com o desconforto ou, o mínimo de conforto, do paciente. O motorista do meu caso, pegou os atalhos esburacados na saída para evitar os engarrafamentos da cidade.
O aperitivo indigesto fez prever o que estava pela frente.
Depois de trocar as faixas de gaza, digo, gaze, várias vezes (eu, como malabarista ficava equilibrando para tapar a venta direita...), chegamos ao destino.

Quem está à flor da pele, agora, sou eu. Mais, né?!

Sou, neste momento, um dos muitos que aguardam vaga para internação em apartamento conforme rezam os contratos.
Vejo pelas divisórias de vidro o movimento inquieto dos aventais brancos, sentado numa estrutura fria de aço inox.
Entra Breno, sai Breno, entra Horácio, sai Horácio.
Paciência que é bom, nada de entrar.

Puts, com esse inconveniente, acabei com o feriadão das famílias que estava planejado para o sítio de Esmeraldas.
O jeito foi ficar imaginando, pra consolar, que nada vem do nada, e que fui, apenas, um mero agente para alterar alguma situação indesejável que poderia acontecer.
É...

As enfermeiras bem treinadas e dulcíssimas, ficavam por perto para evitar erupções vulcânicas tanto do nariz como do paciente.
Quando assentaram-me numa cadeira de rodas e começaram a transitar pelos corredores enormes do Felício Rocho, pensei: Agora vai, devo estar a caminho do bloco cirúrgico.
Que nada. Aquilo era mais uma operação sossega leão.
Chegando numa outra sala menor, explicaram que estavam aguardando uma vaga pra me instalarem no tal apartamento.
Aí comecei a pensar e, é aí, que o bicho pega.
Se eu estava numa fila de prioridades, sei lá qual era a minha, veio o complexo de vira latas e, tome reclamações.
Apareceu uma senhora de branco aparentando pertencer à classe média-alta da casa para escutar e tentar reduzir o tom das minhas lamúrias.
Ao ver ou achar que estava entendendo, a situação piorou pro lado deles.
Caraca (termo que me permito, diferente do que usei aos berros)!! Se chegar algum bacana aqui, posso garantir que vocês encaminham a bosta desses processos rapidinho. Vai a m..., pô.... (= ao anterior).
-Realmente, senhor, temos um apartamento muito confortável disponível mas, o convênio não cobre os valores.
-Vai a m... de novo. Faz seguinte: me instalem lá até que a cirurgia aconteça e depois, quando vagar o tal apartamento conveniado, façam a mudança.
Uma diária, pelo menos, acho que consigo pagar.
Resolvido!! A cadeira recomeçou a andar e, ante os protestos dos companheiros de outros infortúnios  que entenderam um possível privilégio contra eles que aguardavam há mais tempo, fiz a enfermeira condutora parar a viatura pra explicar: realmente eu cheguei neste hospital há menos tempo que vocês, mas, desde às seis horas desta manhã eu estou dentro desse sistema tétrico de saúde. Fui transferido de Lavras para cá em regime de urgência!! Isso aqui é, só, uma continuação.
Não sei se foram meus argumentos ou a sangueira espalhada pela roupa, é que fizeram silenciar os presentes.
Brincando um pouco e, para resumir, o tal apartamento mais parecia uma suite presidencial. Um entra e sai de serviçais do hotel, digo, hospital, digno de cinema.
Eu, que nunca estive nem aí pressas coisas, ainda consegui tempo para soltar meu pensamento na direção das diferenças e privilégios sociais que assolam, ainda, o nosso pobre país.
Resta o "consolo" de que na terra do tio Sam é igual ou pior. Depois querem falar mal de Cuba.
Lá, a saúde e a cultura não são privilégios de poucos como aqui.
Dignidade para viver?!
Não, não é só isso!
O que falta aqui, é dignidade, até, para morrer.

Fechei o olho na sala de cirurgia e abri o olho numa cama da UTI. 
Depois fui informado que a cirurgia demorou mais de duas horas.
Mais ou menos isso!
Operação feita.
Simples, mas delicada.
Ora, se é simples, como pode ser delicada?!
Vai entender!!
Só sei que cauterizaram uma artéria interna cujo nome oficial é: Ligadura de artéria esfeno-palatina a direita.
Voltei prum outro apartamento para continuar a recuperação.
Não sei da condição da minha cabeça, mas os outros indicadores estavam ótimos.
Pressão arterial, por exemplo, na faixa de 13 por 8 ou bem próxima a isso.

OBA!! Fiquei livre da tesoura na cara !!

Agora é tentar me comportar e aguardar a alta médica.
Muito difícil essa história, principalmente quando envolve a proibição do tabaco. Se fumar, prejudica. Se, não, a ansiedade prejudica também.
Nessas alturas o Horácio, meu filho e querido acompanhante, tinha virado uma espécie de fanático religioso.
Todavia, um pastor do bem, preocupado com a recuperação do seu pai.
A Rosana, que chegara de São Paulo ajudou muito.
Começa a sair tensão e começa entrar desequilíbrios emotivos represados.
O mundo prático é o saco que todos conhecem.
Depois de tantas pressões psicológicas os sistemas nervosos dos envolvidos estavam em frangalhos.
Junte a isso o temperamento esporrento dos nossos ancestrais italianos e teremos, mais ou menos, o clima do apartamento que virou inferno nuns momentos.
Brigas que acabam, sempre, em lágrimas, beijos sentidos e arrependidos.
Ótimo. Somos humanos.
Foi tanta agitação entre eu, Horácio, Breno e a estrutura envolvida - fora o sistema nervoso que tava pra lá de Marraquech - coisas, sim, podem ter concorrido que não fossem exatamente os acontecimentos que ora são narrados por mim.
Na verdade, tava todo mundo meio pirado depois de tanta tortura. 
Estou só narrando o que percebi que aconteceu.
Discutir mérito disso ou daquilo é de menor importância. Todos, enfim, ajudaram muito.
Depois da cirurgia, a meta, era cair fora do ambiente hospitalar o quando antes.
Maior agonia a minha de ver tanta gente em função de um só problema.
O esquema estava assim:
- a Ju com a Fátima em Contagem;
- Iana, Ully e o Lutti em Esmeraldas, com o Breno fazendo das tripas coração para equacionar inevitáveis idas e vindas para Contagem e/ou BH;
- a Michelle, minha nora, no sítio do namorado de sua mãe em Igarapé e o Horácio, quando foi rendido pela Rosana, rumou pra lá também;
- domingo a Rosana voltou para Barueri e o Horácio assumiu de novo seu posto até que saísse a alta médica que ocorreu dia 20/02 pela manhã;
- meu carro ficou em Lavras na garagem da casa do Horácio onde vizinhos cuidavam da Hello e do Zé Bob;
- o carro do Horácio, um Palio esportivo que estava à venda, depois do capotamento da sua caminhonete ocorrido quatro dias antes desse corre-corre, reassumiu a sua condição de veículo principal família, pronto para transportar o operado de volta pra casa.
- hora de esquematizar o retorno.
Sugeri que a Ju fosse para a praça da Cemig em Contagem para baldear a Fátima e, a Michelle e o Horacinho, para algum lugar sombreado e próximo da Rodovia Fernão Dias evitando, assim, que retardasse a viagem de volta. Aconteceu tudo diferente. Pela manhã, no dia da alta, apareceu o Sr. Azadinho, meu sogro, no Hospital. Aí mudamos os planos. Pedi que a Michelle continuasse no tal sítio e a Ju em seu apartamento, para encontrar a melhor forma de atender a agenda do meu sogro, ou seja, deixá-lo em seu apartamento de Contagem antes do almoço que estava sendo feito pela cunhada Márcia. Ufa!!

- apesar das curvas, quebra molas, estradas mistas - ora asfalto, ora calçamento, ora pequenos trechos de terra - já estávamos no município de Igarapé trafegando na direção do sítio.
Eita coisa boa, pessoal.
A casa parece que nasceu no mato.
Santa Desorganização!!
Apesar de confortável era tudo muito simples.
Graças a Deus!!
A mãe da Michelle, o seu namorado Celso, todas as irmãs, sobrinhos, maridos e uma netinha do Lutti estavam lá curtindo os ares da natureza.
No ar o cheiro de comida mineira da melhor qualidade sendo feita no fogão a lenha pela Roberta, irmã da Michelle.
Dessa forma, sucumbi a tentação de ficar pro almoço.
Estava irresistível.
Enquanto a comida não ficava pronta pedi que o Horácio me levasse até uma área que tenho no Condomínio Fazenda Mirante, na mesma cidade.
Fomos até lá e, na volta, a notícia que o Lutti tinha almoçado uma galinha caipira de um sítio vizinho.
O danado ficou soltinho-soltinho nesses dias.
Em Esmeraldas, sofreram as codornas do Breno que, no entanto, não fizeram parte do seu cardápio. Serviram só pra correrem de lá pra cá enquanto ele latia em volta do codorneiro.

Depois do almoço pegamos a estrada e voltamos pra casa.
Agora está tudo normal, na medida do possível ...
Desculpem o longo texto.
Só peço que não considerem a possibilidade de uma história, sequer parecida.
Deus me livre.

Fred, 29/02/2012

"Ainda estou me recuperando da cirurgia feita em BH. Cheguei ontem. A cabeça, que nunca foi lá essas coisas, ainda está meia boca. Acabei com os planos do feriado de carnaval da família. Ficaríamos no sítio do Breno, meu genro, em Esmeraldas. Por ser delicada e um pouco rara, a cirurgia, que resumiu-se numa cauterização de uma artéria interna(?) na laringe ou faringe ou, ainda, nenhuma das duas, teve de ser feita na capital. Foi muita agitação presse pobre amigo seu. Se não fizer reviver, um dia eu conto os detalhes. Por enquanto ainda estou engrossando sangue...
Facebook, 21 de Fevereiro às 10:56"

"Foi, mais, um susto pai d'égua, que qualquer coisa. Ainda recuperando-me, dá pra reverenciar alguns médicos deste país que não sucumbiram à condição tétrica do sistema de saúde. Deus queira que esses discípulos de Hipócrates continuem fortes para caminhar descalços nessas areias escaldantes. Uma coisa é ver notícias sobre isso na TV. Outra é viver na carne ou, ver de perto as carências do setor. Não fossem as investidas de parentes, amigos e profissionais do mais alto quilate desse ramo, eu não estaria na condição que estou hoje. Já passamos da fase de procurar culpados. O negócio é resolver o mais rápido possível. Inadmissível continuar com esse cenário onde todos: população, médicos e planos de saúde fazem das tripas coração para respirar. Só investir não resolve. É necessário gerir de forma competente. Quaisquer avanços do Brasil, caem, caíram ou caírão por terra enquanto a saúde, a segurança e a educação estiverem mal das pernas. Beijão para todos aí também! PS: antes que algum precipitado venha com qualquer conjectura partidária ou politiqueira, devo dizer que não estou livrando a cara de "ninguém" do passado..."
Facebook, 22 de Fevereiro às 13:59 


sábado, 11 de fevereiro de 2012

Será que mudou muito?







Antes que algum aventureiro lance mão de conjeturas, vou logo afirmando que não sou petista.  Nada contra quem é.  Prefiro, apenas, a liberdade de pensar sem qualquer amarra.  Já deu! (Fred, 11/02/2012) 

O Brasil segundo Carlito Maia.  

Publicado na Gazeta Esportiva de 21/06/1987

Quatro Ases e Um Coringa

Para Olívia saber como era o País do seu avô...

Sou um cavalo bravo domado pela filha para ser cavalgado pela neta. Olívia nasceu de Malu e Joel no sábado em que Zico e Sócrates perderam os pênaltis contra a França. Pelo primeiro aniversário hoje, reproduzo "O País dos Dormentes", artigo que escrevi para a terceira página de um grande jornal que, todavia, não o publicou.

Não sei como será o Brasil do tempo de Olívia, mas quero que ela saiba como era isto aqui no tempo do seu avô, coitado. É este pobre presente para a neta nº1, a primeira, a única, a mais querida de todas. Sei que esta página será guardada até quando ela puder ler (e entender) o que aqui escrevo agora.

Deitado eternamente em berço esplêndido, o Brasil é o rei da dormência. E estaria importando 200 mil dormentes da Argentina, a 26 dólares cada. Para a Ferrovia do Ouro? Não, para mais uma reconstrução da Ferrovia do Aço, a interminável. Curiosidade: o dormente nacional (!) custa abaixo de 20 dólares a unidade - e tem a dar com o pau mas, pelo sabido, importar é a solução.

Lembra "Tanga", filme que o genial Henfil acaba de concluir, em que conta histórias da ilha da fantasia, onde os nativos exportavam seus próprios cabelos, para poderem importar ricas perucas. "O humor é a delicadeza do desespero", definiu Boris Vian. O super-homem existe e o nome dele é Henfil, revelo eu. A gente aqui exporta matas, bosques, florestas, selvas, toda a Amazônia, se der veneta, mas - importamos ... dormentes. Resultado: o geólogo Orlando Valverde, que preside o Centro Nacional de Defesa e Desenvolvimento da Amazônia, prevê que a "continuar o atual ritmo de desmatamento, Rondônia ficará sem suas florestas no próximo ano; Mato Grosso perderá as suas em 1989, o Maranhão em 1990, o Pará em 1991, o Acre em 1997, Roraima em 2002 e o Amazonas em 2003. O território do Amapá é o que está menos ameaçado: sua floresta deve durar até o ano 2059."

O Brasil pós-tudo da Inventona de 1º de abril virou uma Suicíndia, crueza cruel de Suíça das contas numeradas com Índia das turbas esfaimadas. Os números são de Cláudio Abramo: três milhões de supermarajás, 30 milhões de vítimas privilegiadas e 100 milhões de vítimas desgraçadas. Barril de pólvora "no capricho".

Pior: além de sermos um país sem memória, perdemos também a vergonha, um povo cuja capacidade de indignação foi dissolvida em decretos-leis, alguns até secretos. Fomos transformados em dócil rebanho, mansa manada. Povo bom taí: não tuge nem muge, tudo bem. Vai daí que engole toda sorte de atentados contra os seus direitos mais elementares, sem dar um pio.

O último general no Planalto pediu que o esquecêssemos mas não tá fácil: as ordenanças que deixou tomando conta do lugar deitam e rolam nos fofos tapetes da Nova Ditadura, digo, República. E promovem seu animado Baile da (Bras)ilha Fiscal, a Nova Realeza se divertindo tanto que nem percebe os sinais das ruas. Mergulhada num oceano de pus que reduz a lagoa o mar de lama de antigamente, a massa de vítimas principia a botar a boca no trombone, não dá mais pra segurar.

Já os grandes meliantes, com a impunidade total de que desfrutam - mais o princípio da "obediência devida" - não estão nem aí. Enquanto isso, nas periferias da vida, Rotas "vingadores" e "polícias mineiras" se encarregam dos pés-de-chinelo.
O prefeito da favela do Vergueiro foi claro: "O Brasil tem dois códigos - o civil, para os poderosos e o penal, para os miseráveis". Não é a toa que nos exterminamos nessa de "cada um por si e Deus contra todos". Queremos levar vantagens em tudo, ouvindo o dr. Gerson de Vila Rica (sumidade em enfizema e câncer do pulmão), nossos falsos malandros são abençoados por Macunaíma, Herói Supremo e Guia da Nacionalidade.

Graças a tanta sabedoria e inspiração, hoje o rico assalta o pobre no campo e é por esse roubado na cidade, belo negócio. No Brasil pós-64 o crime reina, impávido colosso. O castigo? Anda em vilegiatura pela Suiça, a conferir saldos. Jamais se viu tanta inocência nem tal pureza: a pátria amada é o céu dos anjos.

Mania de campeões, ganhamos A Maior Dívida Externa do Mundo. Por apenas. Já não se sabe de quantos bilhões: pegaram o que puderam e torraram onde quiseram, sem nos dar a mínima. E acham que auditoria é revanchismo.

Debaixo do tapetão "PMDB" escondem o lixo da ditadura, mais os detritos da "Nova República". Rabo escondido com o gato de fora, como diz Millôr, o ex-MDB (bons tempos) faz qualquer negócio para "disfarçar" sua condição de governo, de (má) Situação. Brinca nas onze. O dr. Ulisses preside tudo e o dr. Sarney se apraz em ser presidente (de honra) do partidaço que trocou l'espoir pour poire.

São capazes de forçar a aceitação de um papel que fará corar o que a junta militar (codinome "Luzia") deixou na horta. E proclamaram: "nova Constituição será a que o PMDB quiser". Não vai dar outra: uma constituição descartável, não uma razoável.
Mas tornemos à Fuferroabá (Fúria Ferroviária que Assalta o Bananão): é coisa de falido que se põe a detonar cartões de crédito,certo de que não vai pagar mesmo. E seria tão mais inteligente se procedessem à humanização dos trens do subúrbio que transportam milhões de párias aqui e no Rio! Qual, nem pensar!

Nossa gente é autoritária (sabe com quem está falando?) e pouco cordial, desmentindo as lendas. Brasileiro tem muito desejo e escassa vontade. É grande a diferença. Mal e porcamente, sobrevivemos à ditadura de Vargas, à era faraônica de JK, à ditadura militar, a esses autoritarismos todos. Firmamos a Declaração Universal dos Direitos do Homem mas a ignoramos solenemente. E dizemos querer que o Brasil seja uma nação de herdeiros, não de meros sobreviventes...

"Sempre houve - e ainda há - multidões de homens, mulheres e crianças a quem, pelo terror, a miséria e a mentira, se conseguiu fazer com que esquecessem sua dignidade natural, ou que renunciassem ao esforço de fazer com que os outros reconhecessem essa dignidade. Estas se calam. As vítimas que se queixam e cuja voz é ouvida, gozam, já assim, de melhor sorte." Do prefácio de René Maheu para "O Direito de Ser Homem", editado pela Unesco em 1972, ano internacional do livro.

Otto Lara Resende costuma dizer que nada vale Deus ser brasileiro porque alguns brasileiros, são deuses. Verdade. E são tais deuses que nos impõe ditaduras, novas repúblicas, planos cruzados, ferrovias de aço e de ouro.
Acorda, Brasil! O Terceiro Milênio vem aí.

PT saudações.

Carlito Maia