terça-feira, 6 de março de 2012

A COPA DO MUNDO (2014) NÃO SERÁ NOSSA!

(Texto que circula pela internet cujo teor sugere muita reflexão)

A COPA DO MUNDO (2014) NÃO SERÁ NOSSA!
Frei Betto
Para bem funcionar, um país precisa de regras. Se carece de leis e de quem zele por elas, vale a anarquia. O Brasil possui mais leis que população. Em princípio, nenhuma delas pode contrariar a lei maior – a Constituição. Só em princípio. Na prática, e na Copa, a teoria é outra.
Diante do megaevento da bola, tudo se enrola. A legislação corre o risco de ser escanteada e, se acontecer, empresas associadas à FIFA ficarão isentas de pagar impostos.
A lei da responsabilidade fiscal, que limita o endividamento, será flexibilizada para facilitar as obras destinadas à Copa e às Olimpíadas. Como enfatiza o professor Carlos Vainer, especialista em planejamento urbano, um município poderá se endividar para construir um estádio. Não para efetuar obras de saneamento...
A FIFA é um cassino. Num cassino, muitos jogam, poucos ganham. Quem jamais perde é o dono do cassino. Assim funciona a FIFA, que se interessa mais por lucro que por esporte. Por isso desembarcou no Brasil com a sua tropa de choque para obrigar o governo a esquecer leis e costumes.
A FIFA quer proibir, durante a Copa, a comercialização de qualquer produto num raio de 2 km em torno dos estádios. Excetos mercadorias vendidas pelas empresas associadas a ela. Fica entendido: comércio local, portas fechadas. Camelôs e ambulantes, polícia neles!
Abram alas á FIFA! Cerca de 170 mil pessoas serão removidas de suas moradias para que se construam os estádios. E quem garante que serão devidamente indenizadas?
A FIFA quer o povão longe da Copa. Ele que se contente em acompanhá-la pela TV. Entrar nos estádios será privilégio da elite, dos estrangeiros e dos que tiverem cacife para comprar ingressos em mãos de cambistas. Aliás, boa parte dos ingressos será vendida antecipadamente na Europa.
A FIFA quer impedir o direito à meia-entrada. Estudantes e idosos, fora! E nada de entrar nos estádios com as empadas da vovó ou a merenda dietética recomendada por seu médico. Até água será proibido.
Todos serão revistados na entrada. Só uma empresa de fast food poderá vender seus produtos nos estádios. E a proibição de bebidas alcoólicas nos estádios, que vigora hoje no Brasil, será quebrada em prol da marca de uma cerveja Made in USA.
Comenta o prestigioso jornal Le Monde Diplomatique: “A recepção de um megaevento esportivo como esse autoriza também megaviolação de direitos, megaendividamento público e megairregularidades.”
A FIFA quer, simplesmente, suspender, durante a Copa, a vigência do Estatuto do Torcedor, do Estatuto do Idoso e do Código de Defesa do Consumidor. Todas essas propostas ilegais estão contidas noProjeto de lei 2.330/2011, que se encontra no Congresso. Caso não seja aprovado, o Planalto poderá efetivá-las via medidas provisórias.

Se você fizer uma camiseta com os dizeres “Copa 2014” , cuidado. A FIFA já solicitou ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) o registro de mais de mil itens, entre os quais o numeral “2014”.

(Não) durmam com um barulho deste: a FIFA quer instituir tribunais de exceção durante a Copa. Sanções relacionadas à venda de produtos, uso de ingressos e publicidade. No projeto de lei acima citado, o artigo 37 permite criar juizados especiais, varas, turmas e câmaras especializadas para causas vinculadas aos eventos. Uma Justiça paralela!

Na África do Sul, foram criados 56 Tribunais Especiais da Copa. O furto de uma máquina fotográfica mereceu 15 anos de prisão! E mais: se houver danos ou prejuízo à FIFA, a culpa e o ônus são da União. Ou seja, o Estado brasileiro passa a ser o fiador da FIFA em seus negócios particulares.

É hora de as torcidas organizadas e os movimentos sociais porem a bola no chão e chutar em gol. Pressionar o Congresso e impedir a aprovação da lei que deixa a legislação brasileira no banco de reservas. Caso contrário, o torcedor brasileiro vai ter que se resignar a torcer pela TV.

Frei Betto é escritor, autor de “A arte de semear estrelas” (Rocco), entre outros livros.

ZZFred, 06 de março de 2012

2 comentários:

  1. Ê Frei Betto! Joga nas 11! Mais um mineiro de peso, de coragem, de mente aberta, de lucidez exacerbada. Que vergonha dessa submissão às exigências da FIFA, ainda mais vindo de países pobres de educação, de saneamento e de governantes pobres de espírito. É por isso que essa fogueira das vaidades em que se transformou o futebol me interessa cada vez menos.

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    1. Ôpa!! Acho que, agora, vou conseguir responder por aqui.

      Nem lembrava-me que Frei Beto tinha nascido nas Minas Gerais. A quietude das montanhas deve favorecer a inspiração fora, obviamente, o preparo intelectual do escritor. O importante é que ele foi na raiz do problema e deixou as inquietações esmiuçadas num texto esclarecedor.
      No pé que já estão as obras dos estádios, não tem mais jeito de parar e, questionar o que já foi começado, não adianta. A infra-estrutura de transporte, trânsito e hotelaria deveria ter sido pensada antes do Brasil ter se candidatado como sede dessa copa. Quem sabe foi ou, quem sabe as condições que estão postas serão suficientes?! O que mais me preocupa é o desinteresse dos grandes hoteis. Que eu saiba, nenhum deles está aumentando a sua capacidade instalada. É, ou não motivo de preocupação?! Já estou sabendo de casarões em Belo Horizonte que serão alugados para turistas durante o evento.

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